Tereza Delta nasceu em 2 de novembro de 1919, no então município de Santo Amaro. Era filha ilegítima (1) do Coronel João Pereira e da campinense de origem grega Brasilina Delta (2). Por volta de 1924, seu pai foi residir na Bahia, deixando Brasilina com três filhos menores. Apesar da situação conturbada da família, Tereza declarou à imprensa que, até certa idade, teve uma infância economicamente privilegiada em uma fazenda no bairro do Morumbi (Capital) (3). Tudo teria mudado com a morte de Brasilina, em 1929. Sem os pais e com escassos recursos, Tereza foi obrigada a se empregar como operária em um tecelagem no Bairro da Lapa, com apenas 14 anos de idade. Pouco tempo depois, conseguiu trabalho em uma enfermaria da Santa Casa de São Paulo, onde permaneceu por alguns anos. Em seguida, empregou-se na tipografia da “Revista dos Tribunais”, onde enfrentou problemas de saúde (4).
 
Em março de 1937, aos 17 anos de idade, ainda em São Paulo, se casou com o filho de imigrantes italianos Luiz Rivelino (5). Não se sabe o destino desta ligação, mas segundo reportagem do Jornal Folha da Manhã (6), em 1940, Delta se casou com Maurício de Caetano de Castro - pai de seus filhos Maurício e Otília. Em dezembro de 1942, o casal mudou-se para São Bernardo do Campo (7). Castro era um homem da classe média, comerciante de máquinas de costura, com loja estabelecida no centro de São Paulo. O sobrado no qual Tereza e Maurício residiram existe até o hoje, nas proximidades do Paço Municipal. Foi ocupado pela Escola Estadual João Ramalho na década de 1950, e em tempos recentes esteve ocupado pela Guarda Civil Municipal.
 
Tereza nasceu para o mundo político em junho de 1946, quando estabelecera no município a militância do Partido Social Progressista (P.S.P), chefiado pelo ex-interventor estadual Ademar de Barros, que iniciava sua campanha eleitoral visando o governo do estado ( 8 ). Posteriormente, em agosto deste mesmo ano ganharam destaque na imprensa protestos contra a carestia e o desabastecimento, que aconteceram em São Bernardo do Campo, sob sua liderança (9). Nesta época, a futura prefeita já era relativamente conhecida na cidade, por prestar diversos tipos de ajuda aos pobres e desamparados. “D. Teresa é considerada como mãe por todos nós. Se um pobre tem necessidade de qualquer coisa, procura a casa dela e logo é atendido. Quando morre uma pessoa e a família não pode fazer o enterro (...) ela tudo providencia. Se um pequeno é perseguido pelos grandes (...) ela bota até advogado”, declarou um operário que participara dos protestos (10) . No contexto de uma crise geral de abastecimento no Estado de São Paulo, os manifestantes se dirigiram à sede da prefeitura para cobrar do edil medidas contra os comerciantes que estariam escondendo produtos, como banha e óleo, e posteriormente vendendo-os com ágios abusivos. Não foram recebidos pelo prefeito e, em seguida, ameaçaram os comerciantes. Dezenas de policiais foram acionados para guardar o comércio e a prefeitura, ao mesmo tempo em que o óleo e a banha voltaram a aparecer nas vendas , e com um preço reduzido (11).
 
Com a vitória de Ademar de Barros nas eleições estaduais de janeiro de 1947, Tereza Delta, que era presidente do P.S.P. local, obteve do novo governador e padrinho político a nomeação para a prefeitura do município. O primeiro dos 16 decretos ordinários assinados pela prefeita durante seus quase 9 meses de mandato, datado do dia de sua posse - 10 de abril de 1947 - nomeava seu futuro inimigo político Osvaldo Haeser para o cargo de secretário, provavelmente o mais importante do quadro administrativo (12). Mais significativo do ponto de vista social foi o decreto que criou o Posto de Assistência Municipal, possivelmente o primeiro com atividades ligadas à área na cidade, que funcionou no prédio do antigo Casarão do Bonilha – que também abrigava o grupo escolar (13). No final desse mesmo ano, fez intensa campanha para as eleições municipais, nas quais, além de se eleger vereadora, foi fundamental para que o P.S.P. conquistasse outras 8 cadeiras – num total de 13 – na câmara municipal, e também a prefeitura, através de José Fornari. À esta altura, Delta gozava de enorme popularidade na cidade, com grande apoio entre o operariado e em regiões como o Bairro Baeta Neves e o Acampamento do D.E.R., locais onde era madrinha dos respectivos times de futebol, como também o era do Palestra São Bernardo.
 
Em 1948, na época em que era Presidente da Câmara Municipal, Delta fundou a Associação Beneficente Padre Anchieta, com o objetivo de construir o hospital homônimo, pelo qual continuou trabalhando nos anos seguintes. Ainda em 1948, Delta romperia relações com Fornari e parte dos vereadores que ajudara a eleger, travando com eles, no decorrer dos dois anos seguintes , duríssima luta política (14), a qual culminou com a duplicação da Câmara Municipal entre julho de 1949 e dezembro de 1951, episódio que repercutiria em toda imprensa nacional, ampliando significativamente a fama da ex-prefeita (15). Em especial, os confrontos com o vereador e antigo aliado Osvaldo Haeser assumiram proporções trágicas em 8 agosto de 1950,quando , logo após um conflito envolvendo a questão da permanência do campo de futebol do Palestra F.C em área hoje ocupada pela Praça Lauro Gomes, Gumercindo Ferreira da Silva, sub-delegado municipal e colaborador de Tereza, foi assassinado. Haeser, que já possuía uma trajetória marcada por prisão, cassação e outros processos criminais, foi apontado como autor do crime (16).
 
Em 3 de outubro de 1950, Tereza seria eleita deputada estadual para o período 1951-1955, tornando-se a primeira política do município a exercer este cargo no século 20. Por sugestão de Delta, o imóvel que abrigava sua residência foi desapropriado pelo governo do estado para instalação do primeiro ginásio público do município, o “João Ramalho” (17). O ginásio iniciou atividades no local em 1952 e, em 1953, a deputada apresentou um projeto de lei (18) que o transformava em colégio, possibilitando, pela primeira vez, a instalação de um curso equivalente ao atual ensino médio na cidade. Em setembro do ano seguinte, Delta apoiou a candidatura de seu irmão, Edmundo Delta, para a prefeitura municipal. Porém, o fulminante aparecimento do rico e poderoso Lauro Gomes no cenário político local, no mesmo período, frustraria os planos de Delta nessa eleição e também nas seguintes, marcando o declínio de sua trajetória política.
 
Tereza ainda voltaria à assembleia legislativa estadual em 1960, como suplente. Desde que se tornou política, procurou se identificar com a população mais pobre da cidade, através de discursos, onde frequentemente se colocava como antagonista dos pretensamente poderosos – “tubarões”, como ela os chamava , e de um intenso trabalho de assistência prestada, sob diversas formas, a munícipes dessas camadas sociais. Populista, corajosa, polêmica e, por vezes, fisicamente agressiva (19) e desbocada, despertava amor e ódio na cidade. Em um entrevista realizada em 1950 declarou: “ Dizem que sou uma agitadora. Agitadora eu? Só porque defendo os fracos contra os fortes? Não me parece. Comecei sendo operária, conheci por experiência própria o que são as torturas de quem não tem o suficiente para seu sustento e dos que lhes são caros. Nos humildes, na gente de cor, nas mulheres de mãos calosas e nos homens sub-alimentados encontrei minha gente. Sai de uma fábrica para experimentar as lutas políticas, mas na prática. Nada de conversa fiada, de teorias inúteis. Tenho consciência de haver contribuído para a melhoria das condições de vida de muitos meus patrícios. Claro que isso fez desabar por sobre a minha cabeça um oceano de ódios de invejas” (20).
 
Delta faleceu em 1993. Um de seus filhos, Maurício Caetano de Castro Filho, percorreu, a partir do final da década de 60, uma destacada trajetória política no município, tendo sido eleito vereador várias vezes e vice-prefeito no período 1997-2000.
 
 
Tereza Delta.1947. Original: Família de Maurício C. de Castro F.
 
 
 
Notas
 
(1) - Cf. Brasil, S. Paulo, Registro Civil, 1925-2023, FamilySearch (https://www.familysearch.org). Entry for Luiz Rivelino and Biagio Rivelino, 13 /3 /1937. O meio-irmão de Teresa, por parte de pai, chamava-se Antônio Mangabeira Pereira. Era sobrinho, por parte de mãe, do ex-governardo de Bahia, Otávio Mangabeira. Foi também fundador da Escola Técnica Paulista de Agrimensura.
(2) - Cf. Jornal Folha da Manhã, 1/5/1949 cad. 4. p.3.
(3) - Cf. De menina mimada a gata borralheira. Sem meias palavras, Tereza Delta. Jornal Diário do Grande ABC (Edição online), 20/08/2023.
(4) - Cf. Jornal Folha da Manhã, idem.
(5) - Cf. Brasil, S. Paulo, Registro Civil, 1925-2023. Idem
(6) - Cf. Jornal Folha da Manhã, idem.
(7) - Cf. De menina mimada a gata borralheira. Sem meias palavras, Tereza Delta. Idem.
(8) - Cf. Jornal de Notícias, 22/6/1946. p.3.
(9) - Cf. Jornal de Notícias, 11/8/1946. p.8.
(10) - Cf. Diário da Noite. 6/8/1946 p.10
(11) - Cf. Jornal de Notícias, 11/8/1946 p. 10
(12) - Cf. PMSBC. Decreto Municipal n° 26 , de 10/4/47
(13) - Cf. PMSBC. Decreto Municipal n° 35 /1947
(14) - Cf. Jornal Folha da Manhã, idem.
(15) - Cf. Folha da Manhã, 28/6/1949 p.1 ; Diário Carioca, 11/9/1949 p.11 ; Correio Paulistano, 4/4/1950 p.16,
(16) - Cf. Correio Paulistano, 10/8/1950 p.12 e p.16 ; 13/12/1950, p.12.
(17) - Cf. Folha do Povo, 14/12/1954, p.1 e p.4. A desapropriação foi controversa. Delta afirmava que o valor pago pelo governo estadual foi muito abaixo do valor de mercado do imóvel, enquanto que a citada reportagem do Jornal Folha do Povo, insistia, citando alguns documentos constantes do Processo 35.487/1950, que o imóvel foi substancialmente supervalorizado, além de, devido sua à função residencial, ser inadequado para a instalação da escola.
(18) - Cf. Assembléia Legislativa Estadual . Projeto de Lei n.279/1953.
(19) - Cf. Jornal Folha da Manhã, idem ; Revista /“O Cruzeiro”, 1/9/1951. p.112; Revista Manchete 3/10/1953. p.10. Jornal Pacotilha- O Globo (MA), 18/8/1961. p.1.
(20) - Cf. Revisita da Semana (RJ). 9/9/1950. p.3
 
 

 

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