“Ou seja, uma literatura queer ou LGBT deve romper a clandestinidade que sempre foi destinada aos autores e personagens homossexuais. A tal da estante proibida que tinha na casa daquela tia ou tio gay”
(trecho de Não Existe Mais Dia Seguinte – Vitor Necchi).

 

Na postagem passada sobre o romance Bom-Crioulo (1895), de Adolfo Caminha, vimos que essa foi considerada a obra fundante da temática homoafetiva na Literatura Brasileira, assim como alguns estudiosos apontam também o livro Um Homem Gasto (1885), de Ferreira Leal,  como obra pioneira dessa vertente. Podemos citar outros autores e obras que vieram a seguir e trouxeram em suas narrativas essa temática LGBT, como Raul Pompéia na sua obra O Ateneu (1888) e Machado de Assis, em seus contos Pílades e Orestes, publicados na coletânea de contos Relíquias da Casa velha (1906).

 

“Teve que concordar. A união dos dois era tal que uma senhora chamava-lhes os "casadinhos de fresco", e um letrado, Pílades e Orestes. Eles riam, naturalmente, mas o riso de Quintanilha trazia alguma cousa parecida com lágrimas: era, nos olhos, uma ternura úmida. Outra diferença é que o sentimento de Quintanilha tinha uma nota de entusiasmo, que absolutamente faltava ao de Gonçalves; mas, entusiasmo não se inventa”. (trecho de Pílades e Orestes - Machado de Assis).

 

Outro marco importante destacado pelos estudiosos nesse tema foi a publicação de O Menino do Gouveia (1914), de Capadócio Maluco, editado numa coleção chamada Contos Rápidos, considerado o primeiro conto homoerótico da Literatura Brasileira.

 

Não há, entretanto, um consenso entre os literatos sobre o uso do termo “literatura LGBT”: divergências sobre as abordagens das obras sobre essa temática e a orientação sexual de seus autores causam uma grande discussão sobre adotar ou não o conceito nos estudos literários no Brasil. Partindo da discussão sobre essa questão, porém, o escritor Vitor Necchi, autor da obra Não Existe Mais Dia Seguinte (2018), lançou alguns pontos básicos para a definição de uma literatura LGBT.  Segundo ele, deve haver um predomínio (não exclusivo) de autores homossexuais, além de narrativas com enredos e personagens com essa mesma orientação sexual e a condição homoafetiva como determinante da subjetividade, da vida e da produção desse universo na escrita das obras.

 

A partir dessa conceituação, podemos destacar a produção literária, nas décadas de 1960 e 1970, de autores como Cassandra Rios e José Silvério Trevisan, que passaram a escrever mais abertamente sobre as questões do universo LGBT, dando maior visibilidade à temática com suas personagens e narrativas homoeróticas, fazendo uma contraposição a um sistema heteronormativo, que marginalizava a representação das vidas e subjetividades homossexuais no cotidiano brasileiro.

 

“Eu sou uma lésbica. Deva a sociedade rejeitar-me? Em que situação uma homossexual deve ser rejeitada, compreendida ou aceita? Quando engana o homem com as suas dissimulações ou quando enfrenta a sociedade abertamente, sem esconder o que é?” (trecho de Sou Lésbica - Cassandra Rios).

 

Foram décadas para o reconhecimento da diversidade sexual no campo das Letras. Após anos e páginas escritas, a manifestação dessa diversidade se transformava num ato político também na Literatura. Em 2007, foi publicada a coletânea de contos homoeróticos organizada pelo escritor Luiz Ruffato. Trata-se de uma apresentação de autores que desenvolveram a temática gay em algum texto de sua produção, como Machado de Assis, Aníbal Machado, Dinah Silveira de Queirós, Moreira Campos, Harry Laus, Lygia Fagundes Telles, Rubem Fonseca, Autran Dourado, Myriam Campelo, Luiz Vilela e  João Silvério Trevisan.

 

Na produção literária contemporânea, podemos citar obras de Caio Fernando Abreu, João Gilberto Noll, Silviano Santiago, Bernardo Carvalho, Natália Borges Polesso, Angélica Freitas, Fernanda Young, Santiago Nazarian, Samir Machado e Tobias Barreto, tornando ainda mais plurais e diversas sexualmente as narrativas literárias do século XXI e a diversidade de matrizes socioafetivas emergentes.

 

Obras que expressam na contemporaneidade as complexidades e a diversidade sexual de nosso país, expondo seus preconceitos, silenciamentos e invisibilidades de seus sujeitos, com intersecções de gênero, classe e raça e, ao mesmo tempo, tocando em feridas abertas, pouco cicatrizadas, jogando luz sobre a importância da construção de uma sociedade mais justa, tolerante e diversa sexualmente.

 

“Não choro mais. Na verdade, nem sequer entendo por que digo mais, se não estou certo se alguma vez chorei. Acho que sim, um dia. Quando havia dor. Agora só resta uma coisa seca. Dentro, fora”. (trecho de Morangos Mofados - Caio Fernando Abreu).

 

 

 

Vídeos no youtube:

 

Entrevista com escritor André Anciman - autor do livro "Me chame pelo seu nome" – TV Brasil

https://www.youtube.com/watch?v=xDX-Bl87eY0

 

LGBT NA LITERATURA | Louie Ponto e Taty Leitte -

https://www.youtube.com/watch?v=83H7egkrCUg&t=162s

 

 

 

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