Povos Originários Brasileiros – Mulher no Poder, um Pouco de Ciência e Cultura

“Quem tem chefe é índio.” 

BIBLIOTECA PÚBLICA LUGAR DE CONHECIMENTOS - Mulheres na Ciência e em Todos os Lugares – Parte 2

Essa expressão costuma aparecer nos diálogos em ambientes de trabalho, sempre que um trabalhador se refere a outro que ocupa uma posição hierarquicamente superior. Essa resposta “quem tem chefe é índio” pode ser entendida no ambiente corporativo de hoje, por exemplo, como uma expressão que carrega um duplo significado:

O primeiro é o de ser identificado como expressão organizacional de uma estrutura hierárquica ultrapassada, antiga, como se chefe representasse uma figura de poder vertical, única responsável por determinada função. E o segundo é que essa expressão pode carregar, então, uma carga, além de negativa, também preconceituosa.

Preconceituosa porque é historicamente sem sustentação, pois hoje sabemos que a estrutura social dos povos originários brasileiros é muito mais complexa e orientada por relações mais horizontais do que normalmente atribuímos a eles. E hoje, a própria produção de conhecimento nas faculdades de Administração incorporou essa complexidade para criticar modelos de gestão baseados numa estrutura rígida e vertical, como podemos ver no artigo do Professor de Administração Odir Veiga: https://administradores.com.br/artigos/entre-o-lider-e-o-cacique-quem-tem-chefe-nao-e-o-indio

Ao reconhecer que o termo e a prática de chefia são uma forma social de relação de poder criada entre os europeus durante o processo de construção de um sistema capitalista, os CEOs modernos (abreviação da palavra “chefe” em inglês) também se apropriam do termo “cacique” como um sinônimo de liderança. Refere-se a alguém experiente, responsável pela condução da comunidade, que compartilha saberes e responsabilidades. https://pt.m.wiktionary.org/wiki/chefe

https://www.dicionariotupiguarani.com.br/dicionario/cacique/

Curioso, não? Então, não podemos dizer também que há um equívoco, uma deformação do conceito quando atribuímos a políticos com grande influência em determinada região, o termo “caciques políticos”? Não seriam estes melhor identificados como “coronéis”? Mas essa história fica para nossa próxima publicação.  Acompanhe na quinta-feira.

Outra questão importante, aliás, a mais importante que nos trouxe aqui (e que é fruto de outra deformação produzida quando atribuímos às formações sociais de uns práticas relacionadas a outras formações) é a importância e o reconhecimento dos papéis de poder das mulheres nas sociedades originárias brasileiras. Sabe do que estamos falando?

Nessas sociedades, o lugar de mulher também é nas esferas de poder e de organização das comunidades, também chamadas de tribos. Sim, temos mulheres caciques!

Mulheres como Creuza Assoripa Umutina, cacique da aldeia Umutina (região dentro do estado do Mato Grosso do Sul), que é atribuída como sendo a primeira mulher cacique no Brasil. Começou a conquistar autoridade dentro do seu povo por ter sido campeã de arco e flecha em 1988. Importante se pensarmos que a prática da caça é, também, muitas vezes, atribuída aos homens da comunidade. http://www.funai.gov.br/index.php/comunicacao/noticias/1995-indigena-umutina-se-torna-cac 
Há também a cacique Ivanice Pires Tanoné, da tribo dos Kariri Xocó, nos arredores de Brasília

https://revistatrip.uol.com.br/tpm/cacique-tanone-e-uma-das-poucas-liderancas-indigenas-femininas-no-brasil

E também Kôkôti Xikrin, que foi escolhida como cacique da comunidade indígena Xikirin do Cateté. Detalhe: ela tem 28 anos, ou seja, novas lideranças também surgem entre as mais jovens.

https://jornaldebrasilia.com.br/noticias/brasil/pela-primeira-vez-comunidade-indigena-elege-uma-mulher-como-cacique/

São muitas e estão em diversos lugares de autoridade dentro de suas comunidades e do Brasil. O link abaixo traz uma pequena relação dessas mulheres fortes e de suas lutas:

https://catarinas.info/43-mulheres-indigenas-do-brasil-e-da-america-latina-para-se-inspirar/ 

E aqui, precisamos fazer uma pergunta ao nosso querido leitor:

Ora, se estamos vendo um pouco da complexidade da estrutura de relações sociais entre os povos originários brasileiros, não seria importante questionarmos também a ideia de que esses povos seriam dotados apenas de experiências práticas de observação da Natureza e não teriam capacidade de produzir ciência?

Para desconstruirmos o pensamento de que os povos originários que habitavam o território brasileiro não possuíam e possuem história ou ciência, temos um ótimo vídeo da pesquisadora Manuela Carneiro da Cunha. Ela fala sobre a pesquisa científica dos guaranis, os quais têm consciência de serem sujeitos históricos e dotados de saber teórico científico. Assista, é muito interessante!

https://www.youtube.com/watch?v=-PZWDWupnWQ

Como “não damos ponto sem nó”, essa provocação sobre a existência de saber científico entre nossos povos originários é pra seguirmos colocando em evidência a força e a luta das mulheres latino-americanas também nesse campo. É fundamental destacar a importância delas nas ciências, sobretudo, porque ciência em nosso continente não pode estar desconectada do engajamento em diversas causas para superar nossos problemas.

Então, na próxima terça-feira, falaremos de duas poderosas cientistas latino-americanas: a brasileira Bertha Lutz e a dominicana Idelisa Bonelly, esta última bióloga marinha conhecida como a mãe da conservação marinha no Caribe. Mãe, mulher, Pachamama… continue conosco ao longo desse mês pra compartilharmos mais histórias de mulheres que estão em todos os lugares.

 

 

 

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