“Trago em mim o inconciliável e é este o meu motor”. (Mayombe, de Pepetela).

O livro selecionado para o Clube de Leitura Leitores da Cidade para o mês de novembro é o romance Mayombe, do escritor angolano Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos, conhecido pelo pseudônimo de Pepetela. Publicado em 1980, Mayombe narra, através de seus personagens, a luta pela independência de Angola.

O livro é dividido em seis capítulos e a narrativa desenrola-se no contexto histórico da luta pela libertação de Angola do jugo colonial de Portugal, durante as décadas de 1960 e 1970, trazendo à obra, em seu texto, um caráter anticolonialista.

“Nasci na Gabela, na terra do café. Da terra recebi a cor escura de café, vinda da mãe, misturada ao branco defunto do meu pai, comerciante português. Trago em mim o inconciliável e é este o meu motor. Num Universo de sim ou não, branco ou negro, eu represento o talvez”.

A história tem uma narrativa polifônica. Vários narradores intercalam-se nos capítulos do livro e descrevem o cotidiano de um agrupamento de guerrilheiros do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), com seus anseios, angústias e questionamentos frente à luta revolucionária que travavam contra o exército português. Cada um desses narradores-personagens sintetizam o caráter diverso das etnias e culturas dos povos que integravam aquele grupo de resistência e luta armada, e os conflitos e rivalidades internas que se davam por conta desta pluralidade, que o autor chama de “tribalismos”.

“O Chefe de Operações não pode comigo, desconfia mesmo de mim, mas isso é normal. O povo daqui não apoia, homem de Cabinda é logo traidor[...] Esse povo não é traidor, mas precisa de ver a guerra está a sair mal ao tuga”.

A trama se desenvolve em um base guerrilheira na floresta do Mayombe, uma região de Angola, que dá título a obra. A floresta também é apresentada como um personagem importante da narrativa, pois ali os rebeldes guerrilheiros se escondiam e se organizavam, planejavam seus planos de ataque a posições inimigas. A floresta também lhes dava alimento nos momentos de maior privação alimentar, além de proteção:

“O Mayombe tinha aceitado os golpes dos machados, que nele abriram uma clareira. Clareira invisível do alto, dos aviões que esquadrinhavam a mata, tentando localizar nela a presença dos guerrilheiros. As casas tinham sido levantadas nessa clareira e as árvores, alegremente, formaram uma abóbada de ramos e folhas para as encobrir. [...]. E os homens, vestidos de verde, tornaram-se verdes como as folhas e castanhos como os troncos colossais”.

Personagens como o comandante Sem Medo, o Comissário Político João, os guerrilheiros Teoria, Lutamos e Mundo Novo, e a professora Ondina são os protagonistas e os agentes da revolução, representam os sujeitos em luta contra o colonialismo de Portugal. A invasão colonial das terras angolanas durante séculos é colocada em xeque por esses personagens do romance, assim como a luta pela identidade nacional e cultura dos povos de Angola.

Ataques e conflitos são narrados na obra. Os diálogos travados entre os personagens e também com suas consciências, trazem uma série de aspectos que marcaram as lutas anticolonialistas na África. Batalhas contra o imperialismo dos países europeus, que submeteram países, nações e culturas aos seus interesses políticos e econômicos.

“O brilho do diamante são as lágrimas dos trabalhadores da Companhia. A dureza do diamante é uma ilusão: não é mais que gotas de suor esmagadas pelas toneladas de terra que o cobrem”.

“Mayombe” é um libelo da luta anticolonial e antifascista. Pepetela, nesta obra contemporânea da Literatura Angolana, traz, na sua escrita, a luta de uma geração revolucionária, que, através da luta e da resistência armada, queria construir nações e povos independentes do colonialismo, construir uma nova Angola, livre da opressão e do domínio colonial português. Como no romance, muitos tombaram nesse caminho e muitas questões não foram resolvidas com a declaração de independência em 1975, entretanto, os personagens de Pepetela nos movem com seus ideais e até mesmo com suas contradições, típicas da nossa humanidade.

“As flores de mafumeira caíam sobre a campa, docemente, misturada às folhas verdes das árvores. Dentre de dias, o lugar seria irreconhecível. O Mayombe recuperaria o que os homens ousaram tirar-lhe”.

 

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