Na década de 1970, a Prefeitura Municipal de S. Bernardo do Campo estimou que a população da cidade para o ano de 1975 seria de 302.031 habitantes. O dado indicava que o crescimento demográfico havia sido muito intenso nos anos anteriores, uma vez que o Censo Nacional de 1970 havia apurado um contingente de 202 mil moradores. Esta explosiva tendência de crescimento permaneceria por toda a década, como mostrou o recenseamento de 1980, que contabilizou 465 mil munícipes. Pelos critérios governamentais (1), o porte da cidade poderia ser considerado grande já há mais de uma década. Sua extraordinária oferta de emprego industrial atraia migrantes de todas as partes do Brasil, que por sua vez eram os grandes impulsionadores do crescimento demográfico (2).
Uma pesquisa publicada em julho do ano anterior mostrava que 51% dos migrantes residentes na cidade haviam chegado nos 4 anos anteriores. A maioria deles provinha da própria região sudeste (73 %). Dentre estes, a maior parte nascera no próprio do estado de São Paulo – interior e capital. A região nordeste era outro centro migratório importante, contribuindo com 17% dos residentes no município, um contigente que vinha seguindo uma uma tendência de aumento desde os 4 anos anteriores (3).
Neste ano, a economia nacional foi marcada por conseqüências da crise do petróleo, iniciada em 1973. A inflação anual continuou alta, na casa dos 30% (IGP), e o crescimento do PIB caiu de 9,7% (1974) para 5,4%. Embora não exista um cálculo para taxa de desemprego neste ano, a desaceleração da economia provavelmente afetou a capacidade da cidade em oferecer oportunidades de trabalho para o grande número de migrantes que continuava chegando à região. Esta conjuntura socioeconômica se liga, por sua vez, à questão da ocupação desordenada do solo no entorno das áreas já ocupadas por loteamentos urbanos planejados. Em 1972, a cidade contava com 5552 pessoas vivendo em seis zonas de ocupação irregular - as chamadas favelas , as quais abrigavam um total de 1004 moradias (4). Em março de 1978, a prefeitura municipal cadastrou 34025 indivíduos e 6815 habitações na mesma situação, ocupando 47 núcleos distintos. Estes dados indicam que, em um intervalo de 6 anos - que inclui o ano de 1975 – a população vivendo em favelas foi multiplicada por 6,1 (5). Em meio ao desafio de continuar ampliando a estrutura urbana – aprovação e fiscalização de loteamentos, pavimentação, iluminação, construção de áreas de lazer, escolas e postos de saúde, etc – no ritmo exigido pelo crescimento populacional, a prefeitura pretendia atacar o problema da habitação através da empresa de economia mista - a PROCAP - que até aquele ano financiara casa própria para cerca de 100 famílias (6).
A PROCAP era uma das cinco subsidiárias da PROSBC, outra empresa de economia mista, que constituia o coração do programa “Administração Sistema-Empresa”, o qual caracterizou a gestão do prefeito Geraldo Faria Rodrigues, sendo responsável por ações em várias áreas, na cidade, e em outras regiões do país. Em 1975, a PROTUR, que também era responsável pelo Parque Estoril, realizou importantes reformas na Cidade da Criança, instalando no local alguns dos brinquedos mais emblemáticos do parque, como o chamado “Submarino”. Na época, o espaço vivia seu auge, recebendo, anualmente, centenas de milhares de visitantes, egressos de todas as partes do Brasil. A PRODASB, especializada em informática, também se destacou no ano, ao instalar um centro de processamento de dados (C.P.D) no Forum João Mendes, em São Paulo. O contrato com o Tribunal de Justiça do Estado previa a microfilmagem e informatização de milhares de documentos relativos aos cartórios de protestos de São Paulo, além da prestação de assistência técnica por 5 anos. A inauguração do C.P.D contou a presença do prefeito Geraldo Faria Rodrigues e do governador Paulo Egídio (7).
A cidade iniciou o ano lidando com as conseqüências das chuvas do último final de semana de 1974, que causaram, mais uma vez, inundações na região central e em outros bairros da cidade. Mais de 30 lojistas locais - a maioria do setor de móveis - sofreram grandes prejuízos, e culparam obras realizadas pela prefeitura junto ao do Rio dos Meninos pela obstrução do fluxo das águas, que acabaram enchendo toda a Avenida Faria Lima e provavelmente trechos da Rua Jurubatuba. A administração atribuiu o problema à intensidade da chuva e ao atraso de outras obras – referentes à retificação do rio - que dependiam de verbas externas ( 8 ). No final do mês de janeiro, o prefeito Geraldo Faria Rodrigues procurou obter um financiamento federal de Cr$ 270 milhões para aplicar em um plano de emergência contra enchentes (9). Contundo, foi a irregularidade no fornecimento de água, em São Bernardo e em todo ABC, que se constituiu em um dos mais persistentes transtornos do ano de 1975. O prefeito chegou a declarar que a falta d’agua era o principal problema do município. Em junho, para discutir a questão, Geraldo se reuniu com outros prefeitos da região e diretores da SABESP. Estes últimos anunciaram medidas que visavam a regularização do abastecimento, estando entre elas a entrada em funcionamento de um novo conjunto de bombas no reservatório do Rio Grande (10).
No plano político, ainda sob o regime de ditadura militar, o Brasil viveu um ano difícil. A despeito do anúncio de “lenta, gradativa e segura distensão” feito pelo presidente Geisel, em agosto de 1974, o período foi marcado por perseguições e violência estatal, as quais chocaram a sociedade após a morte do jornalista Vladimir Herzog, no dia 25 de outubro, em instalações do exército, na capital paulista (11). A cidade de São Bernardo do Campo era governada pela ARENA, partido de apoio ao regime, que, além do executivo, possuía 15 das 17 cadeiras da Câmara Municipal. Além de dois vereadores, o MDB local possuía um deputado federal, Odemir Furlan, o primeiro representante da cidade no congresso nacional desde a década de 1950. Assim como aconteceu em outros municípios, a prefeitura chegou a celebrar os 11 anos da instalação do regime militar, no dia 31 de março, considerado o dia da “Revolução” pela ditadura (12).
No âmbito da cultura popular e do lazer, se destacavam espaços como Odeon Clube, Clube Bochófilo, Esporte Clube S.B, Olaria F.C, Associação dos Funcionários Públicos, Volkswagen Clube, que freqüentemente realizavam bailes e shows musicais noturnos nos finais de semana. A cidade contava ainda com o velho Cine S. Bernardo, já decadente, na Rua Marechal Deodoro, e o recém-inaugurado Cine Hawai, que exibia grandes sucessos do momento, como “O Exorcista” (13), "Assassinato no Expresso do Oriente" (14), e “Inferno na Torre” (15). Contrastando com as novidades culturais promovidas nestes espaços, um dos últimos grandes eventos do ano foi a tradicional Procissão dos Carroceiros, que contou com a presença de cerca de 500 veículos e personalidades que eram célebres no município desde as décadas de 1940 e 1950, como os Padres Jerônimo Angeli e Fiorente Elena. Foi realizada no dia 7 de dezembro e não fez o trajeto de costume, pela Rua Marechal Deodoro, tendo percorrido a Rua Tiradentes e a Avenida Prestes Maia na maior parte do percurso (16).

Vista da área central de S. Bernardo do Campo. 1975. A região já era significativamente verticalizada. A grande maioria dos grandes edifícios, que existem até hoje, havia sido inaugurada há menos de 8 anos. Algumas construções remanescentes do primeiro terço do século XX ainda podiam ser observadas, como os galpões de algumas fábricas de móveis, da tecelagem Vila de S. Bernardo, e o sobrado de Ítalo Setti – posterior sede do Hospital S. Bernardo, no topo da Rua Terezinha Setti, no canto superior direito.
Notas:
(1) - Cf. Estado de São Paulo. Secretaria de Desenvolvimento Social do Estado de São Paulo. 14/4/2025. Disponível em https://www.desenvolvimentosocial.sp.gov.br/.../informac.../.
(2) - Cf. São Bernardo do Campo. Prefeitura Municipal. Secretaria de Planejamento e Economia. Subsídios Estatísticos 75/76. São Bernardo do Campo, 1976. p.67.
(3) - Cf. Ibidem. p.83.
(4) - Cf. São Bernardo do Campo. Prefeitura Municipal. Secretaria de Obras. Subsídios Estatísticos II . São Bernardo do Campo, 1973. ps. 73 e 74.
(5) - Cf. São Bernardo do Campo. Prefeitura Municipal. Secretaria de Saúde e Promoção Social. São Bernardo do Campo, 1978. p.7.
(6) - Cf. Jornal A Vanguarda, 30 /11/75, p.4.
(7) - Cf. Jornal A Vanguarda, 21/12/75, p.1.
(8) - Cf. Jornal “O Estado de São Paulo”, 1/1/1975.
(9) - Cf. Jornal A Vanguarda, 28/1/75, p.1.
(10) - Cf. Jornal A Vanguarda, 26/6/75, p.1.
(11) - Cf. Gaspari, E. A Ditadura Encurralada. São Paulo, Companhia das Letras, 2004. p.73.
(12) - Cf. Jornal A Vanguarda, 30/03/75 ps. 1 e 4.
(13) - Cf. Jornal A Vanguarda, 26/1/75, p.3.
(14) - CF. Jornal A Vanguarda, 13/7/75, p.3.
(15) - Cf. Jornal A Vanguarda, 28/12/75, p.3.
(16) - Cf. Jornal A Vanguarda, 14/12/75, p.1.
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