UMA HISTÓRIA DAS PANDEMIAS – PARTE 6: GRIPE ESPANHOLA NO BRASIL E CURAS MILAGROSAS


"Em nossa opinião a misteriosa moléstia foi fabricada na Alemanha, carregada de virulência pelos sabichões teutônicos, engarrafada e depois distribuída pelos submarinos que se encarregam de espalhar as garrafas perto das costas dos países aliados, de maneira que, levadas pelas ondas para as praias, as garrafas apanhadas por gente inocente espalhem o terrível morbus por todo o universo, desta maneira obrigando os neutros a permanecerem neutros". (Trecho de matéria da Revista Careta).
 
Assim como no início da atual pandemia de coronavírus, quando, em 1918, chegaram as notícias sobre a tal Gripe Espanhola (que na Espanha era conhecida como Gripe Francesa), as reações foram semelhantes, sobretudo no sentido de minimizar seus impactos em terras tupiniquins.

Naquele ano, o Brasil perdeu o presidente eleito Rodrigues Alves exatamente para a Gripe, quando assumiria seu segundo mandato. Ele era tido como uma esperança no combate à epidemia, se ela chegasse, pois, no início do século XX, quando foi eleito pela primeira vez, foi responsável pelo combate à epidemia de febre amarela.

No Brasil, um país gigante, mas ainda com poucos grandes centros urbanos, a epidemia castigou bastante as capitais litorâneas. No Rio de Janeiro, então capital do país, com números mais confiáveis, estima-se que morreram mais de 15 mil pessoas. Entre 1872, data do primeiro censo oficial, até 1920, o Rio de Janeiro passou de 272 mil habitantes, para mais de 1 milhão e 100 mil. Estima-se, porém,  que mais de 65 por cento da cidade adoeceu pela Gripe, sendo, assim como hoje, constatado que a maioria dos doentes pertenciam às camadas de trabalhadores mais pobres. Saindo dos dados, vamos conversar um pouco sobre como a epidemia era tratada em seu cotidiano? E aqui falaremos um pouco das curas milagrosas e das diversas interpretações sobre a origem da Gripe Espanhola. Na nossa epígrafe, trecho da matéria da revista Careta, que possuía uma linha satírica de jornalismo, a sua interpretação estava centrada na epidemia como uma arma de guerra. Outro detalhe importante, como uma nova tecnologia de guerra, os submarinos foram importantes nisso.

Como os médicos ainda não sabiam como tratar, uma das receitas utilizadas foi a quinoa, caldo de galinha e limão. Aqui, cabe diferenciar o que é Medicina e Ciência, o que é sabedoria popular e dos povos tradicionais e o que é o charlatanismo. A Medicina mal conhecia os vírus e o impacto da epidemia estimulou a busca por tudo que fosse possível. Um dos remédios encontrados foi a Grippina, um remédio homeopático desenvolvido pelo laboratório de um conhecido médico homeopata da época, Alberto Seabra. Entre as culturas populares e no cotidiano, era difícil a distinção entre alopatia e homeopatia, tanto que ainda hoje há debates sobre isso.

Diferentemente foi o caso dos comprimidos de oxyform e até do quinino. Como a cloroquina hoje, o debate pode estar centrado nas formas de divulgação que os apresentam como curas milagrosas. O quinino, por exemplo, é usado no combate à Malária. Outro ponto que gerou debate foi o uso de máscaras. Caso conhecido aconteceu na cidade norte-americana de São Francisco. Explicamos abaixo:

Em 1919, pessoas críticas e descrentes das restrições sanitárias impostas como forma de conter a disseminação da doença, resolveram criar uma liga anti-máscaras, que, assim como no Brasil de hoje, promoveu manifestações acusando as autoridades de violar seus direitos constitucionais. Naquela época, em que a Ciência da Microbiologia ainda não tinha dados e pesquisas consolidadas sobre o tema, era de se entender manifestações desse tipo, pois era difícil contra-argumentar sobre direitos feridos, diferentemente de hoje, que há um grande movimento de desinformação.

Depois de vários protestos e mortes pela doença, a Gripe Espanhola sumiu em 1919, mas com outros surtos ao longo de épocas posteriores. Aqui no Brasil, a saída da Gripe gerou naquele ano um dos maiores Carnavais da história. Quem sabe, após a vacinação da população e a adoção massiva dos protocolos sanitários, a gente não possa se encontrar num próximo Carnaval? 

 

Tabela do IBGE e texto do Arquivo Histórico de São Paulo sobre o crescimento histórico das cidades:
https://censo2010.ibge.gov.br/sinopse/index.php?dados=6
http://www.historica.arquivoestado.sp.gov.br/imagemepoca/anteriores/abril2011/

Sobre a Revista Careta:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Careta_(revista)

Sobre como os presidentes brasileiros combateram a pandemia
https://www.bbc.com/portuguese/brasil-56031995

Sobre o uso de máscaras:
https://www.bbc.com/portuguese/internacional-52588711

Sobre a Gripina e o Oxyform:
https://www.bbc.com/portuguese/geral-53576486

Vídeos interessantes
https://youtu.be/Ru8nTLbYdQw
https://youtu.be/O1X3n2taO8o

 

 

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