Brasil e Estados Unidos, para além da semelhança no tamanho de seus territórios, são países continentais possui uma semelhança histórica no que concerne a formação de suas sociedades: foram sociedades escravistas durante o período colonial e a escravidão conformou as relações sociais, onde o preconceito ainda é muito forte. Os tempos da escravatura não são apenas um ponto longínquo na história de ambos os países, as suas marcas definem as relações sócio econômicas e culturais até o presente momento.

https://www.scielo.br/pdf/ea/v14n38/v14n38a07.pdf

https://www.slavevoyages.org

As diferenças são várias mas essa semelhança nos permite juntar esses dois países nessa segunda série do Projeto. 

Então hoje traremos um trio de cientistas estadunidenses que atuam em várias áreas do saber e se destacaram por não se dedicarem “apenas” em fazer ciência, mas pelo envolvimento em diversas causas e na participação na construção histórica em seu país.

Biblioteca Pública Lugar de Conhecimentos - Cientistas Pretos Estadunidenses

Biblioteca Pública Lugar de Conhecimentos - Cientistas Pretos Estadunidenses

Não são exemplo de meritocracia, ao contrário, são pontos fora da curva, são exceção de uma regra que exclui pretos e pobres das posições de destaque e poder.

Com vocês um astronauta, uma oftalmologista e um físico saxofonista de jazz. Esperamos que seja uma boa jornada. 

A Dra Mae Jemison nasceu no Alabama em 1956 e, com apenas 16 anos, ganhou uma bolsa para estudar engenharia química na Universidade de Stanford.

Nessa Universidade foi gestada grande parte das revoluções tecnológicas da segunda metade do século XX passando por ela referências como os criadores da HP, Google e Paypall, por exemplo, entre outros tantos cientistas e tecnólogos famosos, e, na grande maioria,brancos.  

https://www.estudarfora.org.br/stanford-university/ 

Formada em engenharia química, Mae ainda obteve o bacharelado em estudos afro-americanos. Depois, fez medicina na Universidade de Cornell e durante a faculdade trabalhou como voluntária em Cuba, no Quênia e em um campo de refugiados cambojano na Tailândia. Em 1987 foi aceita pela Agência Espacial Norte Americana, a Nasa, e, em 1992, tornou-se a primeira astronauta negra do mundo e no ônibus espacial Endeavor, foi chefe de pesquisa em vários experimentos científicos nessas missões.Ainda hoje é professora na Universidade de Cornell.

https://go.nasa.gov/3e0Oi2l

https://bit.ly/2CXZ0cN

Já a Dra Patricia Bath foi uma premiada oftalmologista pioneira. Nascida em 1942, no Harlen, de Nova York teve em sua família, pai e mãe, inspirações para seguir. Seu pai, Rupert Bath, o primeiro maquinista negro do metrô norte-americano e serviu como marinheiro mercante, com jeito de jornalista foi um bom cronista de suas viagens pelo mundo; Gladys, sua mãe foi o componente étnico-cultural que moldou sua personalidade ativista; era descendente de escravizados africanos e índios Cherokee. 

Em 1959 foi selecionada para um programa de verão em uma escola de Nova York, onde trabalhou com médicos no campo de pesquisa de câncer e acabou por desenvolver teorias e uma equação matemática que poderia ser utilizada para prever a taxa de crescimento do cancro, sendo premiada em 1960. 

Formou-se em Bacharel em Artes em Nova York e logo se matriculou em medicina na Universidade de Howard, em Washington DC, onde concluiu com honras. 

Em 1968, ano da morte de Martin Luther King volta a Nova York para trabalhar como estagiária no hospital do Harlen e inicia sua especialização em oftalmologia. Desenvolveu pesquisas importantes como a de que os negros eram duas vezes mais propensos a sofrer de cegueira e oito vezes de cegueira causada pelo glaucoma do que a população em geral. Diferenças raciais? Não. Sua conclusão foi a de que a falta de acesso a atendimento médico especializado na infância por serem mais pobres. 

Criou o conceito de oftalmologia comunitária, com o envio de voluntários para realizar exames e aviar receitas de óculos, evitando problemas futuros. 

Em 1974 foi para Califórnia, ensinar oftalmologia na Universidade de UCLA. FOI CO-fundadora do Instituto Americano para a Cegueira e defendeu a visão como um direito humano básico. 

Foi a inventora da técnica mais segura e rápida para a cirurgia de correção da catarata. Morreu de câncer em 2019.

https://bit.ly/3imWIUU

E , por fim, mas não menos importante, o Dr. Stephon Alexander, físico especialista em cosmologia e saxofonista de jazz, “Numa noite de epifania, Alexander apercebeu-se de que as ligações íntimas entre a música e a ciência – em particular, entre o jazz e a cosmologia, a sua área de estudo – lhe abriam portas para mundos inexplorados.” 

Essa é parte da história desse filho do Bronx nova-yorkino (para onde se mudou com oito anos) e de pais imigrantes de Trinidad Tobago, e que numa aula de física no segundo grau viu na sala de seu professor, as fotos de Albert Einstein de um lado e de John Coltrane de outro. 

Isso foi a inspiração para sua vida e carreira que se consubstanciaram num livro chamado o “Jazz da Física, a ligação secreta entre a música e o universo.”

Nascido em 1971, formou-se em ciências em 1993 doutorou-se em física no ano 2000. Sua carreira como pesquisador o levou ao Imperial College, em Londres e também ao centro de acelerador atômico de Stanford. 

Ao longo de sua trajetória acadêmica, uniu seu estudo em cosmologia com a música, desenvolvendo teorias “entre dois conhecimentos previamente percebidos como incompatíveis. Assim trabalhavam Coltrane, Einstein e os demais gênios da história. Esse é o truque para inovar, para descobrir, para criar pensamento. Movimentar-se no campo de uma só disciplina é a armadilha para criadores por excelência, o passaporte para a esterilidade.” 

Em 2013 escreveu um artigo para o New York Times em que defendia a necessidade de que os acadêmicos pretos se esforçassem para difundir a ciência entre as novas gerações.

https://bit.ly/3gfCVoo

https://bit.ly/2ZzCmzn

E de novo voltamos à pergunta: qual a relação, o que une essas três personagens que expressam as contradições de uma sociedade com passado escravista ainda hoje? 

Destacamos três cientistas pioneiros em suas áreas, premiados e reconhecidos pelos trabalhos desenvolvidos. Contudo o que os une é o reconhecimento de que representam sim uma camada da população que sofre ainda com discriminação (lembremo-nos do caso de George Floyd acontecido agora) e seu ativismo se dá pela educação; todos eles defendem a difusão de seus trabalhos e atuaram e atuam na educação, como elemento que pode democratizar uma sociedade. E despertar e aguçar a curiosidade e a criatividade é parte constitutiva desse processo, como a música, por exemplo.

Associar o jazz à ciência não é apenas uma ilustração indireta, uma analogia distante. John Coltrane, o homem que definiu as novas fronteiras para as possibilidades de tocar saxofone, tinha plena consciência da importância da matemática e da física em sua música. Suas associações à Einstein não são licença poética, e sim, fazem parte da íntegra de sua obra. Seu álbum “A Love Supreme” mistura a música à ciência e ao percurso místico, nem sempre a ciência e a religiosidade se opõem, se polarizam. Love Supreme é uma obra prima do século XX, que conta com o luxuoso auxílio de McCoy Tinner no piano, Elvin Jones na bateria e Jim Garrison no baixo, um dos maiores quartetos da história do jazz.

Mais algumas dicas:
A Love Supreme Part 2 Resolution - John Coltrane:
https://www.youtube.com/watch?v=CsxtKQW9ggg
https://www.youtube.com/watch?v=KE3IOuh-_zM

A LOVE SUPREME - Livro em Português A História da gravação de um dos
maiores álbuns de Jazz.

John Coltrane - Conheça mais deste mestre.
https://www.youtube.com/watch?v=nlwSM3EaH_I

E para encerrar esta segunda série do projeto, sábado voltamos para o Brasil para vermos como, de alguma forma, a música se apropria de temas científicos contemporâneos e cria representações críticas de como elas são vistas no cotidiano ao longo do século XX.

 

 

 

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