Uma das mais marcas mais fortes de seu tempo, a fábrica de chocolates e doces Dulcora surgiu como um empreendimento da família Gardano, que já tinha tradição no ramo: anteriormente, o patriarca Carlo Mario estivera à frente da Chocolates Gardano, situada no Brás, que existiu entre 1921 e 1957, ano em que foi comprada pela Nestlé. Embora hoje quase esquecida, a Gardano deixaria como reminiscência mais duradoura a emblemática embalagem de seu chocolate em pó, com dois frades preparando uma receita, imagem herdada e utilizada pela Nestlé até os dias de hoje em seu produto equivalente (1).

Um ano depois da venda da antiga fábrica, os Gardano fundaram a Dulcora (2), instalando-a em um terreno na altura do km 22 da Via Anchieta (São Bernardo), numa área que pertencia ao antigo lote colonial da família Boralli, onde depois foi aberta uma rua batizada com o nome de Carlos Mario. A empresa, tocada principalmente pelos irmãos Ezio e Paulo, filhos de Carlo Mário, destinava-se a produzir drops, balas, bombons, chocolates em pó ou em tablets, entre outros itens. Iniciou suas atividades com força total, tendo, já em 1961, cerca de 320 funcionários e sendo apontada uma das líderes no setor em termos de mecanização (3). Uma de suas máquinas era a embrulhadeira, que proporcionava um dos diferenciais do seu principal produto, o Drops Dulcora, famoso por seu slogan “embrulhadinhos um a um”, amplamente divulgado na mídia de então. Na época, não era costume no mercado embalar individualmente as balas e drops, e, sendo assim, a empresa fazia questão de mostrar em sua publicidade a particularidade do produto, que impedia que as pastilhas açucaradas grudassem.

Os investimentos em marketing, por sinal, foram um aspecto importante da história da empresa. Anunciavam frequentemente nas tvs, rádios, jornais e revistas; faziam distribuição gratuita de seus produtos para crianças (4); contrataram por anos como garoto-propaganda ninguém menos que Pelé (5), o brasileiro em maior evidência na época. Especialmente em São Bernardo, foram promovidas excursões, onde alunos da rede pública eram levados para conhecer a fábrica. Também alugaram espaço na Cidade da Criança (1970) para ações de comercialização (6).
Tais esforços, concentrados sobretudo na divulgação do drops, levaram o produto a uma ampla dominância no mercado. Por volta de 1972, o Dulcora representava cerca de 70% dos drops vendidos no país (7).

Com planos ambiciosos ,a empresa buscou variadas formas de ampliar sua capacidade de investimento, produção e distribuição. Em 1964, lançaram-se no mercado de capitais; entre 1968 e 1970, a fábrica foi significativamente reformada e ampliada, visando expandir a produção não só do drops mas também da linha de chocolates; em 1971, tomaram um empréstimo junto ao BNDE (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico) para formar uma empresa distribuidora juntamente com a Duchen (8).

Porém, ao longo da década de 70, sem alcançar com os outros produtos o mesmo êxito que tiveram com o drops, emergiram muitos problemas com credores (9), como o próprio BNDE, que pediu a execução fiscal da fábrica (10). A empresa teria assim uma rápida derrocada, tendo sua falência decretada em março de 1980 (11). A força da marca do drops, contudo, ainda era muito forte: em 1979, uma pesquisa indicava que ela era ainda a mais lembrada pelos consumidores paulistas naquela modalidade (12). Tendo consciência disso, uma outra empresa adquiriu os direitos de uso do nome: a Q-Refres-Ko Indústria e Comércio, responsável por algumas marcas de sucesso nos anos 80, como os chicletes Ploc e as balas Soft. O drops Dulcora seria assim relançado por esta empresa em 1985 (13), ganhando uma sobrevida até o início da década de 90, quando saiu definitivamente do mercado.

 


Nas imagens: acima, a Dulcora em uma vista aérea de 1977; abaixo, uma excursão à fábrica dos alunos do Parque Infantil da Paulicéia, em 1970.

 



Notas:

(1) Busch, J.C. Chocolate do Padre e Outras Histórias. Portal GNoticia 30-01-2021.

(2) Diário Oficial do Estado de SP. 10-10-1958

(3) Correio Paulistano, 26-03-1961

(4) A Tribuna, 10-10-1961

(5) Revista Manchete, 24-09-1966, 04-10-1969; Revista Placar, 15-01-1971.

(6) Decretos PMSBC 2369/70; 2554/71

(7) Revista Veja. Edições 200-212, 1972.

(8) Diário da Noite, 07-07-1964, O Jornal, 16-07-1964; A Vanguarda 21-06-1970; Relatório de Atividades BNDE, 1971, parte 1.

(9) Rodrigues, M.P. Um Jornal, Uma Vida - A Saga do Jornal de S. Caetano e Outras mais. Fundação Pró-Memória de S. Caetano do Sul. 2005.

(10) Diário Oficial do Estado de SP, 28-12-1979.

(11) idem, 04-11-1980.

(12) Diário da Noite, 20-11-1979

(13) Pereira, F. I. Marca Símbolo e Logotipo - Identidades visuais Mercadológicas. Monografia de Conclusão de Curso. FEAAC-UFCE. 1988

 

 

 

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