No dia 6 de fevereiro de 1888, o deputado Joaquim Lopes Chaves apresentou à Assembleia Legislativa de São Paulo um projeto de lei visando elevar a antiga Freguesia de São Bernardo à categoria de Vila, emancipando-a da capital paulista, em cujo território, até então, esteve compreendida (1).  Para envio a uma comissão estatística estadual, pouco tempo depois, foram anexados ao projeto um abaixo-assinado e uma série de informações demográficas que visavam demonstrar que a localidade já contava com o número mínimo de  habitantes exigido para a formação de um município (2). O documento trazia um censo realizado em 1886 mostrando que a dita freguesia, cujo território compreendia toda a atual região do Grande ABC, possuía 3667 do total de 47697 habitantes da capital. O número revela um aumento de 43 % em relação ao censo realizando em 1872, que apontava 2568 moradores na região. Tal crescimento se deve ao estabelecimento do Núcleo Colonial S. Bernardo, em 1877, e a intensificação geral da imigração estrangeira que ocorreu no período, especialmente na segunda metade da década de 1880. Entre maio de 1887 e fevereiro de 1888, segundo o mesmo documento, teriam chegado ao município mais 422 migrantes, fazendo com o total de moradores chegasse 4087 almas. Supondo ainda uma leva indeterminada de habitantes que entraram no município entre outubro de 1886 e maio de 1887, os documentos anexados ao projeto estimavam uma população de 5000 moradores, o que seria suficiente para que o projeto pudesse ser aprovado (3). O abaixo-assinado trazia assinaturas de várias dezenas de moradores que apoiavam a causa, entre eles o pároco da Freguesia - Tomás Inocêncio Lustosa , o médico e professor José Luiz Fláquer, e o sub-delegado Francisco Antônio de Oliveira Salles, comerciante e proprietário de grandes terrenos na região central da localidade.

     Pouco mais de um ano depois, em 27 de fevereiro de 1889,  o projeto receberia aprovação definitiva na assembleia,  e em 12  de março seria finalmente  transformado em lei e sancionado pelo presidente provincial, Pedro Vicente de Azevedo (3).  Porém, ainda era necessário instalar o município,  através da criação dos  primeiros órgãos administrativos. Uma vez que, passados vários meses, a instalação não ocorreu, os moradores encaminharam outro abaixo assinado ao governo do estado, pedindo a aceleração do processo e a data para a eleição dos primeiros vereadores (4). Era necessário que existissem espaços para abrigar o legislativo municipal e também uma cadeia.  Decidiu-se pelo aproveitamento do antigo casarão que então servia de sede da hospedaria dos imigrantes do  Núcleo Colonial, localizado na atual esquina da Rua Marechal Deodoro com a Rua Tenente Sales, do qual um dos cômodos inferiores serviu como cadeia até o final da década de 1940. Finalmente, em 11 de maio de 1890, o lento processo burocrático era concluído com a instalação efetiva do município de São Bernardo e a indicação do Coronel João Baptista de Oliveira Lima – antigo fazendeiro da região do Rio Grande, de Giuseppe Dal Zotto - comerciante estrangeiro, e de Francisco José da Silva,   para integrar provisoriamente o recém-criado Concelho da Intendência Municipal, elegendo entre si o presidente e o vice-presidente do órgão.

     Durante este processo que durou mais de dois anos, duas grandes mudanças ocorreram nas estruturas políticas e jurídicas do país: A abolição da escravidão, em 13 de maio de 1888, e a proclamação da República, em 15 de novembro de 1889.   José Luiz Fláquer foi militante das duas causas e no momento da criação do município já possuía enorme prestígio na região, como indica o fato de que as autoridades que visitaram o município para proceder as solenidades de sua instalação, como o Dr. Clementino de Souza e Castro – presidente da intendência paulistana,  jantaram e se hospedaram em sua residência (5) . De fato, após o período da intendência provisória (1890-1891), foi realizado o pleito eleitoral para a escolha de seis vereadores, os quais deveriam escolher entre si intendente municipal. A partir daí a influência de Fláquer e sua família na política municipal seria ainda mais forte, com o irmão mais novo Luiz Pinto Fláquer Jr., assumindo a Intendência Municipal entre ( 1892 -1896), e outro irmão,  Alfredo Fláquer ocupando o mesmo posto várias vezes (1897-1899; 1902 -1912).

     Segundo o censo nacional de 1890, a população do novo município, que compreendia toda a atual região do Grande ABC,  atingia, neste ano, a cifra de 7276 habitantes.  Segundo os dados e as categorias utilizadas no mesmo levantamento demográfico, este total se dividia, segundo a cor da pele, em 81% de brancos, 3% de pretos, 7 % de caboclos,  e 9 % de mestiços.  Segundo a nacionalidade os habitantes se dividiam entre 6102 brasileiros natos e 1174 estrangeiros; segundo o sexo, entre  3821 homens e 3455 mulheres; e segundo o grau de instrução, entre 7025 analfabetos e 251 alfabetizados (6).  Na fração ocupada pela atual cidade de São Bernardo do Campo, a quantidade de estrangeiros e descendentes diretos nascidos no Brasil era maior do que nas outras partes do município, devido à criação do Núcleo Colonial São Bernardo, em 1877.  Isto fazia deles o grupo largamente predominante no principal núcleo urbano do município – que se localizava nas proximidades da Rua Marechal Deodoro – e também nas extensas áreas agrícolas que o cercavam e que deram origem a diversos bairros da cidade.

 

Sobrado do século XIX, que se localizava na esquina da Rua Marechal Deodoro com a Rua Tenente Sales. Foi construído pelo Alferes Bonilha, serviu como hospedaria de imigrantes e em 1890 foi a primeira sede do executivo municipal, abrigando também a Câmara dos Vereadores e a cadeia pública. 

Acervo: Centro de Memória de S.B.C.

 

(1)    – Cf.  Anais da Assembléia Legislativa de São Paulo. 1888. p.162.

(2)    – Cf.  Câmara dos Deputados de São Paulo. Parecer nº 83. 1888.

(3)    -  Lei nº 38, de 12/03/1888. C Cf. Santos, Wanderley dos. Antecedentes Históricos do ABC Paulista: 1550 -1892. PMSBC, 1992.   p.261.

(4)    -  O pedido foi protocolado a 16 de agosto de 1889.  

(5)    – Cf. Santos, Wanderley dos. Antecedentes Históricos do ABC Paulista: 1550 -1892. PMSBC, 1992.  p. 263.

(6)    -  Cf. Bassanezi, Maria Silvia C. Beozzo (Org.). São Paulo do Passado – Dados Demográficos 1890 - V.  Universidade Estadual de Campinas. Núcleos de Estudos da População.  1998.  ps.  61, 108, 121,134, 145, 159.

 

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