O cenário tipicamente urbano do Jardim Irajá nos tempos atuais, em grande parte preenchido por edifícios de apartamento, contrasta fortemente com a paisagem rural ali predominante há pouco mais de 50 anos. Nos tempos antigos, se destacava em meio às roças dos sítios e às matas do Montanhão, um tanque com mais de 200 metros de extensão, formado pelo represamento das águas do Córrego São Bernardo Novo, perto da Rua Tiradentes, ocupando as áreas onde estão hoje o Supermercado Joanin e o Escola Carlos Pezzolo e indo um pouco além delas. A origem do tanque era muito antiga, já existindo por volta de 1880, no tempo da formação da linha colonial que leva o nome do córrego. Nessa época, a área do velho tanque e do atual Jardim Irajá estavam compreendidas dentro do sítio da família Cerchiari, imigrantes italianos que chegaram em São Bernardo em 1877 (1). No local, a família construiu um moinho de fubá junto ao reservatório.

No início da década de 1940, os herdeiros dos Cerchiari transferiram aquelas terras ao Sr. Jaime Algranti (2), um imigrante turco de origens judaicas. Algranti morava em São Paulo e atuava na área de exploração mineral, exportando da região de Caparaó, Minas Gerais. Durante a Segunda Guerra Mundial, chegou a exportar mica para a indústria bélica norte-americana (3).

Com o avançar dos anos e da urbanização nas proximidades (a vizinha Vila do Tanque surgiu por volta de 1950), a antiga propriedade se fragmentou em lotes menores, especialmente na margem da Rua Tiradentes, onde no fim dos anos 50 havia terrenos pertencentes a Jaime Kilinski, Domingos João Ballotin e ao ex-prefeito Lauro Gomes. Também aproximadamente nessa mesma época, vivia numa chácara nas proximidades do tanque, a família capitaneada pelo casal Hiromassa Araki e Tieko Araki, imigrantes japoneses (ele natural de Hokkaido; ela, de Fukushima) (4), que residiram ali até o início da década de 1970, pouco tempo antes do tanque ser aterrado. Nessa década, os antigos terrenos de Algranti foram adquiridos pela Construtora Cobansa, da família Abdalla, de ascendência libanesa, também à frente de outros empreendimentos na cidade, como a Chácara Sergipe no Jordanópolis e o Jardim Borborema, no Taboão.

Por volta de 1973, a construtora iniciou a concepção do Conjunto Habitacional Jardim Irajá, num espaço de 241 mil metros quadrados, prevendo a construção de 58 prédios e mais 174 casas. Nos anos de 1978 e 1979, enquanto as primeiras edificações eram levantadas, começando pelas casas, anúncios dos imóveis à venda eram veiculados repetidamente em jornais como a Folha de São Paulo (5) e o Diário do Grande ABC (6). As casas térreas, com 2 dormitórios e garagem, eram oferecidas já em dezembro de 1978 com entrega imediata, mediante 10 mil cruzeiros de sinal (equivalente a 2527 reais) (7) e prestações mensais de 6762 cruzeiros (1709 reais). Já com os apartamentos, também com 2 dormitórios, prometia-se a entrega em 12 meses, com o mesmo valor de sinal e prestações de 3246 cruzeiros (820 reais). O anúncio destacava a localização do empreendimento no que seria “a maior área verde de São Bernardo”, situação que começaria a mudar na década seguinte com a forte ocupação também nos arredores.

Mesmo tendo sido lançado em um momento de grande oferta imobiliária na cidade, com muitos loteamentos simultâneos em fase de vendas de terrenos, o Jardim Irajá teve povoamento relativamente rápido. No início de 1984, já viviam nele cerca de 2 mil famílias (8), apesar de toda a crise econômica da primeira metade dos anos 80. A infra-estrutura começou a chegar ao local no mesmo período, com a expansão da iluminação viária (1981-1985), de linhas de ônibus e a construção da Escola Estadual Carlos Pezzolo (1985) e da EMEI do Jardim Irajá ( Atual EMEB Maurício Caetano de Castro) (1987) (9).

Com o tempo, o nome Jardim Irajá ficaria vinculado informalmente também a áreas vizinhas pertencentes a outros donos e loteadas posteriormente, que acabariam dando lugar a outros conjuntos residenciais de prédios, como o Parque Residencial Tiradentes (1989-91), Espanha 2 (1995) e o Parque dos Príncipes (década de 2000).
 

Acima, a Rua Wenceslau Richter, no Irajá, em 1980. Abaixo, vista aérea do Irajá e de seu entorno em 2003.
 

Notas:

(1) - Cf. Livros de matrículas do Núcleo Colonial de São Bernardo. Arquivo do Estado de S. Paulo.
(2) - Cf. Jornal de Notícias, 22-02-1949
(3) - Cf. Bromberg, R. M. Z.. Imigrantes Judeus do Oriente Médio: S. Paulo e Rio de Janeiro. Ateliê Editorial, 2003
(4) - Cf. Registro de Nascimento n. 41819. Cartório de Registro Civil de SBC.
(5) - Folha de São Paulo 3 e 17-12-1978, 14-01-1979
(6) - Diário do Grande ABC 02-12-1978, 17-12-1979.
(7) - Índices atualizados conforme o IPC-SP-FIPE (Correção de Valores do Banco Central)
(8) - Gazeta de São Bernardo 08-02-1984.
(9) - Idem 02-11-1985, 20-08-1987.
 

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