No fim da década de 20 do século passado, poucos anos após as obras que adequaram o Caminho do Mar (Estrada Velha) para o trânsito de veículos motorizados, o crescente movimento de automóveis entre São Paulo e o Litoral fez surgir a ideia de construir uma nova estrada ligando os dois locais. Em 1929, a Assembléia Legislativa de S. Paulo chegou a autorizar uma concessão para a abertura dessa estrada (1), porém a crise econômica que assolou o mundo naquele ano levaria ao cancelamento dos planos. Somente cinco anos depois, quando estudos apontavam já um tráfego mensal de 18 mil veículos pela estrada velha, o então governador Armando Salles de Oliveira publicou novo decreto autorizando a construção da rodovia, mas a obra de fato só foi iniciada em 1939: em maio daquele ano, o interventor federal Ademar de Barros disponibilizou cinco mil contos de réis do tesouro do estado para viabilizar o começo dos trabalhos.

Concebida pelos engenheiros Ariovaldo Viana e Dário de Castro Bueno, a nova rodovia teria 53 km de extensão total, prevendo inicialmente duas pistas com duas faixas de trafego cada no setor do planalto e uma pista na serra, onde seriam abertos 5 cinco túneis. Entre agosto de 1939 e outubro de 1940 ocorreu a grande maioria das desapropriações dos terrenos necessários para a estrada, começando por 24 terrenos na Capital (3). Em São Bernardo, elas iniciaram em outubro de 1939, quando um decreto (4) desapropriou 66 áreas, abrangendo desde as propriedades de Francisco Pedroso e Arthur Rudge Ramos nos Bairros Taboão e Meninos até parte da Vila Gonçalves, no centro da cidade. Em Janeiro de 1940, mais 69 áreas foram declaradas de utilidade pública (5), das terras de Silvio Sabatini no centro até as de Joaquim Brasilio de Lima na Vila Balneária; em outubro, outros 10 terrenos (6), situados na região do Riacho Grande, como os de Sophia Caputo, José Victor de Lauro e Pedro Jorge; um mês antes também ocorreram desapropriações em Santos (7).

Apesar de previsões iniciais chegarem a estipular a conclusão da rodovia em fins de 1941 (8), as obras atrasaram bastante, principalmente devido a escassez de combustível e de outros insumos provocada pela 2ª Guerra Mundial, o que dificultava os trabalhos, em especial os de terraplanagem. A obra ficou quase paralisada em 1942 e boa parte de 1943: em dezembro desse ano, o ditador Getúlio Vargas viria a São Bernardo inaugurar somente 22 km da Rodovia - ou seja, até a altura do Bairro Assunção.

Com a melhora no abastecimento, porém, o ritmo da obra aumentaria e em agosto de 1944 o trecho do planalto estava bastante adiantado, faltando a pavimentação dos últimos 4 km até a serra e a finalização de duas pontes na área do Riacho Grande, uma delas sobre o Canal Schmidt, próximo do Rio das Pedras, e outra sobre o Rio Pequeno - esta considerada uma das partes mais difíceis da obra, onde os operários chegaram a ficar a 24 metros abaixo do nível da água no trabalho de cravação de seus tubulões de fundação (9). Neste tempo, já estava também em obras o trecho da serra, com quatro dos cinco túneis em execução. Em março de 1945, o tráfego de veículos estava aberto até a entrada da Represa Billings (10).

Apesar do ritmo mais intenso, as obras da primeira pista só seriam totalmente completadas em abril de 1947, quando ocorreu sua inauguração por Adhemar de Barros, que acabara de retornar ao governo paulista. Em julho de 1953 seria entregue a segunda pista da rodovia pelo governador Lucas Nogueira Garcez.

O impacto da abertura da Anchieta se fez sentir de imediato, com um trânsito exponencialmente mais intenso entre o litoral e a Capital. Em 1948, ainda antes da inauguração da segunda pista, o movimento mensal nela era de mais de 80 mil veículos, quatro vezes maior do que era verificado na estrada velha alguns anos antes do início das obras da Anchieta (11). A nova rodovia também estimulou o mercado imobiliária nos seus arredores: mesmo durante sua construção, começaram a ser negociados terrenos para instalação de indústrias ou de loteamentos em suas margens, comércio que aumentou conforme a obra avançava. No trecho do planalto, especialmente em São Bernardo, ocorreu, já nos anos 40, a instalação de fábricas de grande porte,como a Varam Motores, a Brasmotor e as tecelagens Elni e Lídia (Matarazzo). Muitas outras viriam nas décadas seguintes, consolidando um período de grande desenvolvimento econômico na história do município. E, junto com as indústrias, veio a expansão urbana, através de novos loteamentos abertos perto da estrada (Jardim do Mar, Parque Anchieta e vilas Planalto, Marchi e Euro, entre outros) ou da expansão de loteamentos mais antigos, como as Vilas Paulicéia, Dusi e Gonçalves. Em São Bernardo, nas margens da rodovia se instalaram mesmo parte dos operários que trabalharam na obra, alocados por volta de 1950 em um terreno na altura do Km 20 pelo Departamento de Estradas de Rodagem, originando o chamado núcleo do DER.

 

Acima, a Via Anchieta na altura do km 18, em 1968; no centro, na altura da Indústria Volkswagen, em 1970;

abaixo, na altura do ponte sobre o Rio Grande, também em 1970.

 

 

Notas:

(1) Goulart Reis, N. Memória do Transporte Rodoviário.1995.
(2) Decreto estadual 10231/39
(3) Decretos estaduais 10418/39 e 10475/39
(4) Decreto estadual 10630/39
(5) ,, 10887/40
(6) ,, 11469/40
(7) ,, 11374/40
(8) Folha da Manhã 6-08-1940
(9) O Estado de São Paulo, 13-08-1944
(10) Correio Paulistano, 6 de março de 1945
(11) O Estado de São Paulo, 13-07-1948

 

 

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