Desde os tempos coloniais até meados do século XIX, as festas, procissões e cultos religiosos foram as principais ocasiões para manifestação de atividades musicais na região da cidade de São Paulo e seus subúrbios (1). Depois disso, no decorrer do mesmo século e até advento da era rádio, nas primeiras décadas do século XX, a progressiva multiplicação dos teatros, cafés, clubes e salões de bailes ofereceram novos espaços para a expressão musical paulista (2), ainda que os antigos ambientes religiosos ainda tivessem uma importância significativa, sobretudo nos arredores rurais da capital - como São Bernardo - onde conservaram a exclusividade e o protagonismo por muito mais tempo. São diversos os registros de grupos musicais atuando neste âmbito em São Bernardo, desde o fim do século XIX até a metade do XX. O Coral Santa Cecília, ligado à paróquia Nossa Senhora da Conceição da Viagem, fundado por Atílio Miele, em 1926, é um exemplo que existe até a atualidade. As bandas ou corporações musicais, desde o século XIX, eram presença constante nas festas religiosas, mas também se apresentavam em diversos espaços laicos, como desfiles cívicos, salões e bailes privados. Usando conjuntos de instrumentos de sopro e percussão, este tipo de grupo musical misturava repertório popular e erudito, além de marchas militares, sendo de grande importância para a música popular brasileira durante esta época e também para o desenvolvimento futuro de diversos gêneros populares nacionais. Em São Bernardo, o primeiro registro da existência de um conjunto local desta natureza é uma notícia publicada no jornal “O Estado de São Paulo”, no dia 12 de agosto de 1884, que assim descreve as participações da banda musical do maestro Elysiário Firmo de Lima na Festa do Milagroso Senhor Bom Jesus da Pedra Fria, realizada no Bairro do Piraporinha: “ ... apresentando-se uniformizada e de instrumentos todos limpos, não poupou esforços para abrilhantar as festas com as melhores peças do seu vasto repertório”. O mesmo Elysiario foi também maestro da banda Recreio Artístico (3) e da Sociedade Musical Beneficente 21 de outubro (4). Posteriormente surgiram outras bandas similares, como a Banda Progresso (1912) e a Carlos Gomes (1924), a mais célebre e longeva de todas. Fundada em 1898, a Sociedade Italiana de Mútuo Socorro “ Italiani Uniti” foi durante muitas décadas a instituição laica mais importante para a realização de atividades musicais em São Bernardo, devido, sobretudo, aos frequentes bailes que aconteciam em seu salão, o qual se situava no atual n. 1359 da Rua Marechal Deodoro. No princípio do século XX, a música em São Bernardo também acontecia em outras situações e espaços. Referindo-se à década de 1920, o memorialista Dionízio Pessotti, antigo morador de São Bernardo, afirmou que “era costume realizarem-se pequenos bailes em casas de famílias conhecidas. Era um meio de diversão da mocidade daqueles tempos. Meus irmãos mais velhos, que eram jovens, frequentavam estes bailes (...) que eram muito simples. Não havia conjuntos musicais; convidava-se um sanfoneiro e a festa estava feita. O sanfoneiro espichava a sua harmônica e as valsas saiam dolentes e chorosas. E os pares rodavam pela sala. Além das valsas, tocavam também algumas marchinhas...”(5 ). Nas áreas rurais do município estes bailes caseiros eram, possivelmente, a única atividade musical. Em relação ao núcleo urbano da cidade, existiam ainda outras formas expressão musical. Uma nota no Jornal “ O progresso”, em 1911, registra a prática de serenatas na cidade e indica que, assim como na atualidade, a mesma música que divertia alguns, ocasionalmente podia ser o tormento de outros: “Algumas pessoas vieram à nossa redação pedir a nossa intervenção para quem de direito para que cesse, ao menos por algum tempo, as serenatas que alguns pândegos fazem pelas ruas desta Vila. Dizem os reclamantes que os tais serenatistas, por falta de melhor divertimento, atormentam, fora de horas, os ouvidos dos pacatos habitantes desta localidade, que se veem privados do sono que restaura as forças de quem tem necessidade de ganhar o pão cotidiano. Ainda mais há certas casas, em cuja frente, os tais da gaita, ficam a esgoelar-se por tempo enfadonhamente longo. Estes pândegos não terão serviço no dia seguinte? Parece-nos que a polícia não deve consentir que se prive do sono a quem precisa trabalhar todo dia. Aí fica a reclamação.” (6 ). Fotografia: Sociedade Musical Beneficente 21 de outubro. 1906. Da esq. p/ dir, na fileira de cima aparecem: (?), Francisco Bassani, André Gerbelli, José Zaia, Raimundo Aguiar, Paulo Pessotti, Giacomo Boff e Mariano Rocco; Na fila abaixo, em pé podemos ver Pinchiari, (?), Francisco Périgo, Alexandre Negri, O maetro Elysiário Firmo de Lima, José Campi, José Farina, Primo Modolin e Adelelmo Setti; Sentados aparecem Gustavo Prugner, Cândido Galvão Bueno, José Coleoni e Oliveira Lima. Esta identificação foi registrada no livro de Gonzalo Labrada (7) e está incompleta e um pouco imprecisa, porém não existem até o momento maiores informações sobre os retratados na imagem. 

Notas:
(1) - Cf. Moraes, José Geraldo Vinci. Arranjos e Timbres da Música em São Paulo. In: PORTA,. Paula (org.). História da cidade de São Paulo – A cidade colonial 1553 - 1822. SP: Paz e Terra, 2004, p. 592-598. 
(2) - Cf. Moraes, José Geraldo Vinci. Arranjos e Timbres da Música em São Paulo. In: PORTA,. Paula (org.). História da cidade de São Paulo – A cidade colonial 1553 - 1822. SP: Paz e Terra, 2004, p. 601-602. 
(3) – Cf. Jornal “O Estado de São Paulo”. 27 de Agosto de 1895.p.2.
(4) –Cf. Labrada, Gonzalo Luís. Memória Musical de São Bernardo. São Bernardo do Campo: PMSBC, Secretaria de Educação, Cultura e Esportes, 1986. p. 12. Nesta mesma página Labrada registra também a existência de duas bandas que tocavam em bailes residenciais, as quais aparecem em uma fotografia de 1892, na residência de Guilherme Bellinghausen. Quase nada se sabe delas além de suas denominações: “Catapreta” e “Dois pretinhos”. 
(5) – Cf. Pessotti, Dionízio. Histórias de São Bernardo. São Paulo, Scortecci, 2010. p.45.
(6) - Cf. Jornal “O Progresso”. 31 de março de 1911, p.1. 
(7) – Cf. Labrada, Gonzalo Luís. Ibidem.

 

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