Por séculos parte da fazenda Jurubatuba do Mosteiro de São Bento da Capital, a área da atual Vila Gonçalves começaria a ser delineada em 1877, quando a dita fazenda foi dividida em 79 lotes rurais, após ser adquirida pelo governo imperial para formação do núcleo colonial de São Bernardo. Em abril de 1878, o imigrante alemão Augusto Lucks  recebeu o título provisório do  lote que formaria a maior parte da vila, quitando, até meados da década de 1880, a compra da área (1). Em seguida, esta foi transferida para Adolpho Lucks, provavelmente irmão de Augusto, que havia possuído anteriormente o lote vizinho (atual Vila Lusitânia) e também comprara na mesma época um lote urbano na esquina das ruas Américo Brasiliense e Marechal Deodoro, onde hoje funciona uma farmácia. Além da área rural, em que manteve plantação de videiras, Adolpho adquiriu junto ao governo imperial terrenos vizinhos a ela, situados aproximadamente entre onde hoje é o final da Rua Olavo Gonçalves e a Av. Faria Lima (2). Eles eram partes de um espaço que havia sido originalmente reservado pelas autoridades para pasto de animais, com uso comum. Porém, com autorização do governo, antes mesmo de efetivar a compra, Adolpho já havia construído uma olaria por ali, onde produziu tijolos e telhas inclusive para reparação de construções públicas locais (3).
 
Esta olaria funcionaria de 1882 até por volta de 1915 (4). Depois, Lucks negociou suas terras, que em meados da década de 1920 já eram propriedade do jornalista português João Domingues Tavares. Este, além de usufruir, com sua família, parcela da área como chácara, planejou um loteamento urbano no local, notando o potencial de crescimento da cidade àquela altura.  Batizado Vila Tavares, o loteamento foi idealizado com um desenho já bem semelhante ao da futura Vila Gonçalves, especialmente o setor entre a R. Jurubatuba  e a Praça Miguel Aires Maldonado.
 
Em 1926, Tavares mandou publicar diversos anúncios no jornal “A Tribuna”, de Santos; primeiro para contratar um agente local para vender os lotes; depois já anunciando os terrenos (5). Nos anúncios, Tavares destacava a proximidade do loteamento em relação ao antigo Grupo Escolar de São Bernardo (onde hoje é a Praça Lauro Gomes) e à efêmera linha de bondes que circulou na década de 1920, entre a Marechal Deodoro e a Estação Santo André.  
 
Embora as vendas tivessem se iniciado, sérios problemas financeiros impediram Tavares de seguir com o loteamento, que foi hipotecado e leiloado em julho de 1935 (6).  Ele seria comprado por Antônio Manoel Gonçalves, rico homem de negócios, oriundo de abastada família de Bragança Paulista. O filho de Manoel, Olavo, retomou o loteamento em 1936, rebatizando-o como Vila Gonçalves e fazendo algumas alterações em sua planta. Dois anos depois já existem registros de moradores no lugar, como é o caso do operário Tiago Julião de Freitas, baiano nativo do município de Remanso, que então se casava com  Belarmina Barbosa (do Riacho Grande); ou do também operário Umberto Ciosani, oriundo do interior de São Paulo, que casaria-se com a vizinha Maria Sabatini, moradora da R. Joaquim Nabuco (7). Estes registros já exemplificam o perfil da Vila Gonçalves como uma vila de trabalhadores assalariados, onde assentariam, nos anos seguintes, muitos migrantes recém chegados dos mais diversos locais, do nordeste ao Rio Grande do Sul.  Apesar do relevo muito irregular, seu posicionamento perto da Via Anchieta e das ruas centrais da cidade, que concentravam o comércio e as fábricas de móveis locais, faziam a vila atraente para quem buscava moradia. Em 1957, quase toda a região entre a Jurubatuba e o fim da R. Elizabeth Gross estava ocupada com construções; os espaços vazios eram  mais próximos da  Via Anchieta - o trecho final da rua Leila Gonçalves ainda não tinha sido aberto de fato. Contudo, até 1980 quase todos os lotes desta área também foram preenchidos.
 
A infra-estrutura chegaria aos poucos ao local, primeiramente a energia elétrica, começando já nos anos 40; depois, a pavimentação das ruas, concluída até o início da década de 1970.  Em 1967, foi inaugurado o prédio do Grupo Escolar da vila (atual Escola Cassiano Faria),e, em  1978, o do Teatro Martins Pena. Já a chegada da rede de água, devido à topografia elevada de toda aquela região, teve percalços: ainda que por volta de 1960 tenha se iniciado a implementação da rede da Sabesp, a região sofria com a falta de água.  Na década de 70, para suprir especialmente as áreas mais altas das vilas localizadas  entre a R. Jurubatuba e a Via Anchieta, chegou a ser utilizada a água de  um poço artesiano situado em terreno das Indústrias Matarazzo (8).
 
Apesar de ser uma vila essencialmente residencial, muitos estabelecimentos comerciais se instalaram nela ao longo de sua história, especialmente nos trechos das ruas Joaquim Nabuco e Jurubatuba (onde havia a famosa Padaria Sidoni) que integram a Vila, mas não só neles: na R. Elizabeth Gross existia  por exemplo o bar e mercearia do casal  Antonio Pinto e Elisa Bassoli, inaugurado em 1953,um dos primeiros da vila (9); e, na  Rua Primo Modolin, o Bar do Miguel, de 1968, existente até hoje
 

Acima a vila em 1952, em tomada feita a partir do antigo casarão do Bonilha (Praça Lauro Gomes);

e abaixo a vila em 1976, no trecho entre a Jurubatuba e  a Olavo  Gonçalves.

 

Notas

(1) - dos Santos, W. Antecedentes Históricos do Abc Paulista, PMSBC, 1992; Ofícios do Núcleo Colonial de SB, Arquivo do Estado de S.Paulo.

(2) - Plantas dos lotes 14, 15, 16 da linha Jurubatuba.  Museu da Imigração  de S.Paulo.

(3) - Correio Paulistano, 23-08-1888.

(4) - Livros de  Impostos de Indústrias e Profissões: 1882 - publicado no jornal O Estado de S. Paulo, 22-08-1882 ;  1890-1892 e 1900-9 - acervo do Museu de Santo André; 1893-99 e 1911-15 - acervo do Centro de Memória de São Bernardo

(5) - A Tribuna, 25-06-1926; 28-10-1926

(6) - Diário Oficial do Estado de S. Paulo, 10-07-1935

(7) - Idem, 26-04-1938,21-09-1938, 26-10-1938

(8) - A Vanguarda 13-01-1974; Folha de São Paulo, 20-08-1978

(9) - Médici, A.  Coluna Memória. in: Diário do Grande ABC, 04-10-2000.

 

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