A série Diásporas ocorreu ao longo de agosto e encerra hoje neste texto sobre a Paraíba e o Maranhão. Falaremos de duas pessoas queridas da cidade, dois artistas, dois parceiros, amigos de tanta gente: Nádia Costa e Paulo Dantas.  

São Bernardo é uma cidade que recepciona. Seja dos idos da Europa, das Américas e África, seja do nosso Nordeste, das minas, do sul. É uma cidade de muitas cores e timbres. Os sons se espalham nas puxadas evidentes dos “erres” no início, no fim e no meio. É tanto sotaque misturado que a gente não para mais para tentar saber de onde ele vem. Todo mundo chega. A cidade, assim, compõe sua paisagem sonora, sempre renovada pelas novas chegadas, pelas novas histórias que chegam e constroem suas vidas aqui. São Bernardo do Campo é esse cipoal que, no final das contas, se reinventa.

Dizemos tudo isso para chegar ao final da série Diásporas, que trouxe histórias e narrativas sobre a Cultura de vários lugares. Aproveitamos agora, então, para homenagear dois artistas da cidade, em nome dos quais, nós lembramos de todos os outros que vieram de outros lugares ou daqueles que aqui nasceram e daqui nunca saíram.

Nádia Costa
Nádia Costa nasceu em São Luis do Maranhão. Foi para Caxias, ainda no Maranhão, e depois passou por cidades de outros estados - Teresina, Belém do Pará e Brasília -, até chegar a São Bernardo do Campo em 1996. Enveredou nas linguagens artísticas em 2002, através das Oficinas Culturais da Secretaria de Cultura. Literatura, Teatro, Dramaturgia, Produção e Montagem Teatral. É cria das nossas oficinas, mas ganhou o mundo.

Daqui foi para Santo André fazer a Escola Livre de Teatro. Em 2009, ajudou a criar o coletivo Ausência em Cena, que, durante sete anos, navegou entre o Teatro e a Literatura com espetáculos e ações que rodaram nossos teatros, centros culturais e bibliotecas. Publicou o seu primeiro texto na coletânea Viela, Palavras, na Editora Lamparina Luminosa - um Ponto de Cultura (então programa do Ministério da Cultura) no qual também trabalhou como coordenadora literária.

Logo depois, em 2010, após uma oficina literária, conheceu o escritor Tarso de Melo, que tocava o Tantas Letras - projeto da Secretaria de Cultura de São Bernardo -, nos centros culturais e bibliotecas. Daí, gerou o Sarau Lapada Poética no Bar Ferradura, que durou sete anos, sempre com o apoio da agitadora cultural e dona do bar Nancy dos Santos.

Nadia não parou. Em 2013, publicou alguns textos na coletânea Livro Livre, na Casa das Rosas, em São Paulo. Desde 2020, acertou parceria com o titeriteiro Celso Oi, participando de um espetáculo do seu Teatro de Bonecos. Mas foi em 2017, em parceria com o artista plástico Marcio Fidelis, que ela criou sua mais candente e maravilhosa obra: a Isadora Fidelis, sua filhinha, que hoje tem quatro anos. Vive a iluminar e alegrar nossos espaços culturais, sobretudo a Biblioteca Monteiro Lobato, e é uma fiel parceira de Nádia. A Nádia e a Isadora nos brindam com graça e beleza, sempre visitando a Biblioteca. É um prazer recebê-las!


Paulo Dantas
“o Sertão vestiu-se de mundo
e na poeira dos dias eu cresci terra
caçando esse barrento oiro”.

Uma conversa com Paulo Dantas, o rapaz paraibano, o professor, o trabalhador braçal, o poeta...
Paulo Dantas é poeta. É difícil falar da poesia do outro sem colonizar, sem enquadrar. A poesia de Paulo bebe na Cultura Popular, mas tem sintonia com outros cânones. Paulo chegou aqui (São Bernardo, Santo André, São Paulo...) na condição de homem da classe trabalhadora, alternando a luta pela sobrevivência como: servente de pedreiro, balconista, professor - com a confecção da palavra, da arte de expor o sentimento e ideias ao mundo.

Para ser mais preciso, Paulo Dantas chegou em São Bernardo no final de 2005, saído de Santa Luzia, Paraíba, lugar onde nasceu em 1984, aportando direto na Rodoviária da cidade, a João Setti. A viagem - a migração - custou cansaço, dor nas costas - física, longa, talhada como é talhada a poesia popular. Esse percurso que, atrelado a outros, um dia gerou um poema chamado Acalanto, do livro Folheto:

haverá um dia
um dia qualquer
qualquer um
em que
à minha porta
(insistente
gritando
gritando
gritando)
baterá
a mais bonita
poesia

entre suas mãos
encontrará abrigo
meu rosto
inquieta
ela fitará
meus olhos
seus polegares
enxugarão
minhas lágrimas
carinhosamente
pousará um beijo
sobre minha testa

nesse dia
ela não me dirá
nada

nada

 Ao ler Paulo, é imaginar o caminho longo que ele percorreu para chegar na nossa cidade:
“- A primeira vez que eu entrei na Biblioteca Monteiro Lobato, em 2008/2009 e tava rolando uma oficina de literatura e as inscrições haviam terminado. Foi quando pedi para participar informalmente,  e a agente cultural disse que não dava, eu insisti, foi permitido, desde lá eu fui ficando” – ele conta a história com emoção.

Saborosamente, Paulo relata as histórias com as pessoas da região que o ajudaram a tecer sua toalha de belezas poéticas. A editora andreense Rosana Banharoli, que ajudou a resgatar e expor sua coleção familiar de cordéis; a parceria com os músicos Edu Guerra e Diego Marques, juntando mouriscos e nordestinos num espetáculo musical que já visitou a Biblioteca Monteiro Lobato (olha ela aí de novo!).

O encontro com o povo da Cultura Popular Nordestina: o Moreira do Acopiara, de Diadema, o Marco Haurélio e sua companheira Lucélia Borges, Pedro Monteiro, de São Paulo. Foi em Santo André, que Paulo encontrou a Dalila e a Maninha Teles Veras da Alpharrabio, livraria, sebo editora e centro cultural, que lançou em primeira edição artesanal o seu belo livro A butija dos Dizer, seu lugar de alento até hoje.

O Paulo, Dantas, é esse compadre que anda, que conhece pessoas, que faz poesia, que trama parceria com a companheira Nathanna, com quem cria o João Miguel, parte forte de toda poesia. E assim, vive a nossa cidade....